O Brasil ainda vive sob a ressaca do fim da eleição de 2014, uma disputa que servirá de material para muita pesquisa na área da Ciência Política e Marketing. Com certeza, a disputa mais acirrada e surreal: com cenário praticamente definido, o candidato Eduardo Campos falece em acidente aéreo no dia 13 de agosto e, assim, a vice de sua chapa, Marina Silva, ocupa o seu lugar na disputa presidencial afirmando carregar os ideais de Campos, das manifestações de junho de 2013 e, por fim, declarando representar a “nova política”.
Além de todo o ideário da “nova política”, como herdeira do legado de Eduardo Campos, Marina Silva também entoou o discurso do rompimento com a polarização entre PSDB e PT, que domina a disputa nacional desde 1994. Colocada desta forma, a candidata do PSB se tornou alvo central dos tucanos e dos petistas, algo normal em uma disputa política. Na campanha do PT, o foco era demonstrar fragilidades discursivas da candidata. Do lado tucano, centrou-se fogo no fato de a candidata mudar toda hora o seu plano de governo. Ficou famosa a frase dita por Aécio Neves de que o programa de Marina era escrito “a lápis” para poder mudar sempre que fosse pressionada.
Somada à pressão sofrida pelos dois maiores partidos políticos do Brasil, a candidata também teve responsabilidade no enfraquecimento de sua própria candidatura. Começou quando voltou atrás na questão da criminalização da homofobia após pedido do pastor Silas Malafaia. Depois, a questão do financiamento da campanha.
Dizia-se “nova política”, mas tinha como vice Beto Albuquerque, ligado ao setor do agronegócio e, além disso, recebia doações de empresas ligadas à indústria armamentista. Ou seja, o discurso da “nova política” não sobreviveu, tucanos e petistas voltaram pra casinha e a polarização entre PT e PSDB se manteve, o que não significa ser algo ruim.
A derrocada
Encerrado o primeiro turno, a grande pergunta era: quem Marina Silva vai apoiar? Logo de cara diziam que ela ficaria neutra ou que apoiaria o candidato Aécio Neves. Também era possível seguir o PSB, que poderia apoiar o PT por conta de sua história política. Parte do PSB ficou ao lado do candidato tucano, deixando muita gente atônita. Roberto Amaral, ex-presidente do PSB, se rebelou e declarou apoio a Dilma Rousseff, assim como as parlamentares Luiza Erundina e Lídice da Mata.
Logo depois, foi a vez de Marina Silva, que, para declarar o seu apoio a Aécio Neves, queria negociar o abandono da proposta de redução da maioridade penal pelo candidato, que negou e disse que o seu projeto político havia sido aprovado pela população. Por fim, no dia 12 de outubro, Marina Silva surgiu de cabelos soltos e declarou apoio ao candidato do PSDB. Em questão de minutos, Silva enterrava todo o seu discurso sobre nova política, pois aderia à chapa defensora da redução da maioridade penal e também do retorno das políticas bilaterais com Europa e Estados Unidos, em detrimento da política multilateral com a América Latina, África e Ásia.
Se Aécio Neves tivesse ganhado a eleição, pode ser que Marina Silva ainda tivesse uma sobrevida no mundo político, pois era fato que ela assumiria um cargo numa eventual gestão tucana. Porém, o PSDB perdeu. E a conta para Marina Silva ficou alta: Aécio e companhia retornam para o Senado; a estadia de Silva no PSB é incerta e o partido, hoje, está completamente rachado; a Rede, que ainda nem virou um partido, também está completamente dividida e muita gente ficou insatisfeita com o apoio de Marina Silva ao tucano.
Marina Silva encerra 2014 assim com encerrou 2010, mas pelo menos na eleição passada ficou neutra e ainda podia utilizar o discurso da “nova política”. Agora, nem isso. A proposta morreu, já que, nesta eleição, ficou claro que construir um jeito novo de fazer política é muito mais complexo que um discurso bonito. Revelou-se também que Marina Silva até pode posar de “sonhática”, mas é puro pragmatismo e encerrou o pleito deste ano aliada com o que há de mais arcaico na política brasileira e acabou por tornar o seu nome inviável para uma futura disputa presidencial.
A eleição acabou e a política “sonhática” também.
Marcelo Haileer * – * Jornalista