Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, do IBGE, indicam que, em 2017, os rendimentos médios das famílias pertencentes aos 10% mais pobres da população variaram de R$ 117,04 (Maranhão) a R$ 773,97 (Santa Catarina). Considerando que uma família usa, em média, um botijão de gás de cozinha (chamado de gás liquefeito de petróleo, ou GLP) por mês, e tendo como referencial o preço do botijão no último mês de junho, é possível constatar que o custo do gás de cozinha na renda familiar representou 59% do orçamento entre os 10% mais pobres no Maranhão, 51,5% no Acre e 50,7% em Sergipe.
Já os menores percentuais foram registrados em São Paulo (10,8%), Distrito Federal (10,1%) e Santa Catarina (8,9%), conforme nota técnica divulgada pelo Dieese. “É bastante impactante, porque é um insumo fundamental para a produção de alimentos e, no caso do orçamento, as pessoas têm um dispêndio grande se o preço do combustível e do gás de cozinha é alterado”, explicou o diretor-técnico do instituto, Clemente Ganz Lúcio, em entrevista nesta quinta-feira (26), ao jornalista Glauco Faria na Rádio Brasil Atual.
Desde julho de 2017, a Petrobras mudou a política de preço do gás de cozinha, com reajustes frequentes para se equiparar ao preço do petróleo no mercado internacional. Assim, o valor do botijão residencial de 13 kg, que ficou congelado em R$ 13,51 nas refinarias da Petrobras entre janeiro de 2003 e agosto de 2015, em julho do ano passado subiu para R$ 17,81 e, em dezembro, atingiu R$ 24,38, um aumento de 37%.
“Temos levantamentos que mostram que o gás de cozinha, em algumas regiões do país, custa R$ 80 o botijão. Tínhamos há alguns anos um preço que era menos de um quarto desse valor, portanto, o preço foi multiplicado por quatro vezes em alguns casos”, afirma Clemente.
Segundo ele, para fugir do preço exorbitante, as famílias mais pobres tem trocado o gás de cozinha por outros insumos, como o álcool, por exemplo, uma mudança que tem causado muitos acidentes. “E é evidente que o impacto mais geral é dos preços praticados especialmente hoje, com a política que a Petrobras adota com os derivados do petróleo. Os impactos são os mais diversos, do ponto de vista econômico, comprometendo muitas vezes a dinâmica econômica, o custo de vida e, no caso dos mais pobres, comprometendo o orçamento familiar”, diz Clemente.
Para o diretor-técnico do Dieese, a Petrobras deveria adotar estratégias específicas na formação dos preços dos derivados do petróleo, especialmente o gás de cozinha, considerando a importância do produto no orçamento familiar. “A desigualdade no Brasil pode e deve ser enfrentada com políticas que permitam às famílias mais pobres terem capacidade de renda e consumo adequadas à sua condição, e uma das formas de fazer isso é por meio de políticas que permitam acesso à eletricidade, ao gás de cozinha, ao transporte coletivo, ao saneamento, educação, creches. São todas políticas que podem e devem ajudar para que enfrentemos e superemos a desigualdade. Colocar toda a responsabilidade e o custo sobre as famílias mais pobres é uma política que vai na contramão do enfrentamento das desigualdades e da justiça social.”
Máquinas paradas
A nota técnica do Dieese mostra que, sob a gestão de Michel Temer, a capacidade de produção de gás de cozinha do Brasil tem diminuído. O motivo é a decisão da Petrobras de reduzir a participação da empresa no abastecimento do país e, consequentemente, a produção das refinarias. Enquanto nos primeiros meses de 2018 a produção nacional diminuiu de 800 mil m³/mês para 670 mil m³/mês, a importação do gás de cozinha aumentou. O Brasil consome, em média, 1,11 milhão de m³ de GLP por mês, quantidade que se mantém estável há anos.
“As importações de GLP, nos primeiros quatro meses de 2018, cresceram 67,9% em relação ao mesmo período do ano passado. Assim, a dependência brasileira em relação à importação de GLP para abastecimento do consumo interno saltou de 24%, nos quatro primeiros meses de 2017, para 40%, no mesmo período de 2018”, destaca o documento do Dieese, ressaltando que a diminuição da produção nacional prejudica a criação de postos de trabalho no país, justamente num momento de altas taxas de desemprego.
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